terça-feira, 3 de abril de 2012

O policial militar do século XXI (Parte III)


O Novo Currículo Policial Militar do Estado do Rio Grande do Norte: um Exercício de Autocrítica[1].

João Batista da Silva[2]

Atualmente, os cursos de formação de soldados das Polícias Militares Brasil estão passando por uma série de reformulações em  âmbito nacional, visto que, com o advento da MCN, as polícias estaduais estão em fase de adequação aos novos princípios instituídos, apesar de já haver transcorrido cinco anos de sua implantação em todo terrítório nacionalmente.
Por outro lado, como afirma Jacqueline Muniz[3]: [...] o divórcio estabelecido entre a consolidadação da nossa jovem democracia e os assuntos relativos à segurança pública tem custado muito caro a todos nós. Nesse sentido, a contiguidade ainda existente entre o hoje e o ontem dos nossos dias de exceção engessa a efetivação de uma relação mais harmoniosa entre a sociedade e as forças policiais (especialmente a Polícia Militar, que se estigmatizou, não sem referentes empíricos, como truculenta e arbitrária nesse período), algo que vem sendo desconstruído de forma gradativa, pois se a democracia brasileira é incipiente, o que dizer dos órgãos criados pelo Ministério da Justiça para atuarem diretamente na construção de políticas e gestão da segurança pública no país? É o que podemos também depreender da leitura abaixo:

Note-se que o processo de maturação democrática das questões relativas à segurança pública é tão recente que as Secretarias Nacionais de Direitos Humanos e de Segurança Pública, órgãos do Ministério da Justiça, foram criados somente nos últimos seis anos. Cabe ainda salientar que o primeiro Plano Nacional de Segurança Pública do país nem completou o seu primeiro aniversário.(MUNIZ, 2001).

Portanto, antes da efetiva implantação da nova Matriz, mesmo já tendo esta passado por um processo de maturação, como fora explicitado anteriormente, a sua operacionalização se dá de forma vagarosa, mesmo os conteúdos estando contemplados na malha curricular compreendida dentro do novo currículo da PMRN.
Os conteúdos sugeridos pela MCN serão analisados a partir das próximas páginas tomando como referência as figuras 02, 03, 04, 05, 06 e 07. Far-se-á então, uma abordagem dentro de ciclo de formação compreendendo um período de 06 anos, desde os cursos de formação de soldados dos anos de 2000 e 2001,  ou seja, duas edições do CFSD que foram realizados antes da implantação da MCN, completando o ciclo nas duas edições subsequentes que ocorreram após a implantação da Matriz, realizadas nos anos de 2004 e 2006, conforme a seguir:
DISCIPLINA
Carga horária
1.
Abordagem Policial
30
2.
Armamento, Equipamento e Munição
40
3.
Criminologia
30
4.
Defesa Pessoal
60
5.
Direito Aplicado ao Policial
60
6.
Ética Policial
30
7.
Fundamentos de Polícia Comunitária
30
8.
Inteligência Policial
20
9.
Língua Espanhola
20
10.
Língua Inglesa
20
11.
Noções de Policia Técnica
30
12.
Ordem Unida
60
13.
Organização e Legislação da PM
60
14.
Policiamento de Choque
30
15.
Policiamento de Trânsito
30
16.
Policiamento Montado
30
17.
Policiamento Rádio Patrulha
30
18.
Português Instrumental
30
19.
Procedimentos em Situação de Conflitos
20
20.
Sociologia Policial
30
21.
Socorros de Urgência
30
22.
Técnicas de Bombeiros
30
23.
Teoria Geral do Policiamento Ostensivo
60
24.
Treinamento Físico Militar
60
27.
Curso básico de tiro defensivo
20
28.
Conscientização e Informações Turísticas
30
29
Direitos Humanos e Cidadania
30
30.
Informática Básica
40
31.
Policiamento Ambiental
30
32
Qualidade no Atendimento ao Cidadão
30
CARGA HORÁRIA TOTAL
1110
Figura 02: grade curricular do curso de formação de soldados – 2000
Fonte: Seção Técnica de Ensino da APM/RN

Uma das primeiras constatações entre as grades curriculares antes e depois da implantação da MCN é, sobretudo, a redução da carga horária. Do ano de 2000 para o ano de 2001,  antes da implantação da MCN, a grade curricular do CFSD sofreu uma redução de 60 horas/alula, isto é, saindo de 1110 para 1050 horas/aula, por curso, sendo a redução mais drástica ainda, no primeiro curso realizado após a implantação da Matriz. Assim, de um total de 1050, o CFSD passou a ter apenas 720  horas/aulas  horas, no ano de 2004, com um curso de duração de 06 meses. Em contrapartida, o CFSD realizado em 2006 teve seu período de duração reduzido para 05 meses, porém sua carga horária foi aumentada, passando a ter 855 horas/aulas (conforme figura 06).

DISCIPLINA
Carga horária
1.
Abordagem Policial                                   
30
2.
Armamento, Equipamento e Munição
30
3.
Criminologia
30
4.
Defesa Pessoal
60
5.
Direito Aplicado ao Policial
60
6.
Ética Policial
30
7.
Fundamentos de Polícia Comunitária
60
8.
Inteligência Policial
15
9
Noções de Policia Técnica
30
10
Ordem Unida
60
11.
Organização e Legislação da PM
60
12.
Policiamento de Choque
30
13.
Policiamento de Trânsito
30
14.
Policiamento Montado
30
15.
Policiamento Rádio Patrulha
30
16.
Português Instrumental
30
17.
Procedimentos em Situação de Conflitos
30
18.
Sociologia Policial
30
19.
Socorros de Urgência
30
20.
Técnicas de Bombeiros
30
21.
Teoria Geral do Policiamento Ostensivo
30
22.
Treinamento Físico Militar
60
23
Curso básico de tiro defensivo
30
24.
Conscientização e Informações Turísticas
30
25.
Direitos Humanos e Cidadania
30
26.
Informática Básica
15
27.
Policiamento Ambiental
30
28.
Qualidade no Atendimento ao Cidadão
30
29.
Estágio Operacional
60
CARGA HORÁRIA TOTAL
1050
Figura 03: grade curricular do curso de formação de soldados – 2001.
Fonte: Seção Técnica de Ensino da APM/RN

Fazendo uma análise para além da performance quantitativa de horas/aula, intenta-se verificar os motivos e os fatores que influenciaram na redução substancial no número de aulas do CFSD, buscando, especialmente, analisar que disciplinas foram mais penalizadas com essa redução e que critérios foram utilizados.
Corroborando com essas constatações e seguindo na contramão dos preceitos emanados pela MCN acerca de uma melhor formação e requalificação profissional,  no sentido de garantir uma unidade de pensamento e ação dos profissionais da área de Segurança Pública, foi adotada pelo Governo do Estado do RN, com a aquiêncencia dos gestores da Polícia Potiguar, uma política de formação descentralizada a qual ficou sob a responsabilidade de algumas Unidades Operacionais.
Vale a pena, para uma melhor compreensão do nosso exercício analítico, levar em conta um certo retrospecto histórico. Apenas a partir do ano de 1998 é que a APMRN estava legalmente a realizar o CFSD. Isto é,  12 anos após o fechamento do CFAP[4] é que foi atribuída responsabilidade a uma Unidade de Ensino de ser a única escola de formação para os novos soldados da PMRN conforme o fragmento abaixo:

[...] a Academia de Polícia Cel Milton Freire é a única escola de formação da Polícia Militar do Rio Grande Do Norte, conforme Decreto nº 14.055, de 09 de julho de 1998, especificamente para o curso em destaque o Art. 104 diz: “Até que seja criado estabelecimento de ensino desdinado à formação, ao aperfeiçoamento e a especialização de graduados PM, tais atribuições serão de competência da APM”. (PMRN, Plano de Curso do CFSD, 2004, p.07.)

Portanto, diante dessa incumbência a APM, no ano de 1999, realiza o primeiro CFSD tendo recebido dez turmas de alunos soldados, que em média tinham de 30 a 40 alunos. Já as Unidades Operacionais[5] do interior formaram uma turma cada, em média.
Essa mesma sistemática foi utilizada nas quatro turmas do CFSD subsequentes, nos anos de 2000, 2001, 2004[6] e 2006 quando a PMRN formou aproximadamente 5 mil novos policiais,  sendo feita a mesma distribuição. A partir de 2006, a Unidade Escola, na capital não era mais a APM, mas o CFAPM.


[1] Este artigo é a continuação, e terceira parte do publicado na RBSP e pode ser acessado na íntegra neste link: http://www2.forumseguranca.org.br/node/28624.
[2] Capitão da PMRN, professor universitário e Mestre em Ciências Sociais.
[3] MUNIZ, Jacqueline. A crise de identidade das Polícias Brasileiras: dilema e paradoxos da formação educacional. Center for Hemispheric Defense Studies. REDES, 2001.
[4] Em 1994, por determinação do Comandante Geral da corporação, o centro de formação teve suas atividades suspensas, dando lugar ao Centro Educacional Alferes Tiradentes – CEAT, criado no dia 04 de março de 1995, conforme Boletim Geral nº 098, de 29 de maio. Esta escola era destinada ao ensino secular, para os filhos dos policiais militares. Entretanto, só funcionou como planejado durante seu primeiro ano, e após esse período, o espaço foi cedido à Secretaria de Educação do Estado, distribuindo-se as vagas não apenas aos filhos dos policiais militares mais também a toda a comunidade civil. Vale ressaltar, que durante os 18 anos de funcionamento, o Centro de Formação e Aperfeiçoamento de Praças formou e aperfeiçoou mais de 5.000 (cinco mil) praças.(SILVA, 2008, p.11)[4], sendo reaberto em 26 de julho de 2006, com a denominação de  Centro de Formação e Aperfeiçoamento da Polícia Militar, através do Decreto nº 19.254, de 25 de julho de 2006.
[5] Designam-se Unidades Operacionais: os batalhões, companhias, pelotões e destacamentos. Ou seja, a missão específica dessas Unidades é realizar o policiamento ostensivo preventivo e repressivo, podendo, entretanto, através de um planejamento específico desenvolver a requalificação profissional dos seus integrantes através de palestras, workshops, etc. No entanto, as Unidades capacitadas para a formação formal devem ser os Centros e as Academias, como explicitado no fragmento do plano do CFSD 2004.
[6] Apesar de a APM ter a incumbência legal como fora explicitado no decreto supracitado, as demais Unidades Operacionais da capital e do interior do Estado também contribuíram com a formação de pelo menos uma turma de alunos soldados nos anos de 2000 a 2004, conforme o Boletim Geral (BG) 06 de 11 de janeiro de 2000, o Aditamento ao BG nº 028 de 08 fevereiro 2001, o BG 31 de 17 de fevereiro de 2004 e o BG 218 de 24 de novembro de 2005 todos de publicação interna.

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